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MorrerDevia morrer-se de outra maneira.Transformarmo-nos em fumo, por exemplo.Ou em nuvens.Quando nos sentíssemos cansados, fartos do mesmo sola fingir de novo todas as manhãs, convocaríamosos amigos mais íntimos com um cartão de convitepara o ritual do Grande Desfazer:"Fulano de tal comunica a V. Exa. que vai transformar-se em nuvem hoje às 9 horas. Traje de passeio".E então, solenemente, com passos de reter tempo, fatosescuros, olhos de lua de cerimónia, viríamos todos assistirà despedida.Apertos de mãos quentes. Ternura de calafrio."Adeus! Adeus!"E, pouco a pouco, devagarinho, sem sofrimento,numa lassidão de arrancar raízes...(primeiro, os olhos... em seguida, os lábios... depois os cabelos... )a carne, em vez de apodrecer, começaria a transfigurar-seem fumo... tão leve... tão subtil... tão pólen...como aquela nuvem além (vêem?) — nesta tarde de Outonoainda tocada por um vento de lábios azuis....José Gomes Ferreira.
José Gomes Ferreira nasceu no Porto em 9 de Junho de 1900.
Licenciou-se em Direito, e posteriormente foi Cônsul na Noruega. Paralelamente, seguiu também carreira como compositor, chegando a ter a sua obra "Suite Rústica" estreada pela orquestra do maestro figueirense David de Sousa.
Ganhou em 1961 o Grande Prémio da Poesia instituído pela Sociedade Portuguesa de Escritores, instituição de que viria a ser Presidente e foi condecorado pelo Presidente da República Ramalho Eanes com a comenda da Ordem Militar de Santiago de Espada, recebendo posteriormente o grau de grande oficial da Ordem da Liberdade.
Faleceu em 8 de Fevereiro de 1985.
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