Poema Brasileiro
No Piauí de cada 100 crianças que nascem
78 morrem antes de completar 8 anos de idade
No Piauí
de cada 100 crianças que nascem
78 morrem antes de completar 8 anos de idade
No Piauí
de cada 100 crianças
que nascem
78 morrem
antes
de completar
8 anos de idade
antes de completar 8 anos de idade
antes de completar 8 anos de idade
antes de completar 8 anos de idade
antes de completar 8 anos de idade
Não há vagas
O preço do feijão
não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão
O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras
- porque o poema, senhores,
está fechado:
“não há vagas”
Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço
O poema, senhores,
não fede
nem cheira
Ferreira Gullar
O GÊNIO FERREIRA GULLAR
Se fosse jogador de futebol, ele poderia ser chamado polivalente. Mas Ferreira Gullar, pelo que me consta, jamais calçou um par de chuteiras na vida. Multimídia? Não gosto desta palavra, que também não combina com ele. Mas vamos lá. José de Ribamar Ferreira, em setembro, completa 80 anos. Lúcido e em plena atividade intelectual, é apontado, quase por unanimidade, o maior poeta brasileiro vivo, embora, já dizia Drummond, poeta não se mede com fita métrica.
Filho de um quitandeiro, nasceu em São Luís, Maranhão, estado mais pobre do Brasil, ao lado do vizinho Piauí, que também deu grandes poetas, como Mário Faustino e Torquato Neto – ambos precocemente mortos. Neste caso, a miséria do Maranhão é a mesma do Piauí, só separada pelo rio Parnaíba.
Mas Ferreira Gullar, pseudônimo literário que adotou, mudou-se para o Rio de Janeiro em 1951, de só onde saiu para o exílio, vinte anos mais tarde, depois de perseguido e preso pela ditadura militar.
Seu livro de estreia, Um pouco acima do chão, foi premiado pelo Jornal de Letras, do Rio de Janeiro. Manuel Bandeira fazia parte do corpo de jurados. Em 1954, publicou A Luta Corporal. Sobre este livro há um episódio curioso. A poesia de Gullar quase sempre esteve focada nas questões sociais. E foi com espanto que o poeta, numa livraria carioca, encontrou seu livro no meio de publicações esportivas. Fato semelhante ocorreu com outro poeta brasileiro, Mario Quintana, cujo livro Apontamentos de História Sobrenatural, repousava na prateleira das xaroposas obras de auto-ajuda.
No exílio, Gullar passou por diversos países, Rússia, Chile, Peru e Argentina. Em Buenos Aires, além de colaborar no jornal O Pasquim, uma das mais importantes publicações da imprensa brasileira no combate à ditadura, para sobreviver, também deu aulas particulares de português. E foi exatamente em Buenos Aires, depois de um longo silêncio, que ele escreveu, entre maio e outubro de 1975, a sua obra mais importante, Poema Sujo, publicado no Brasil quando o poeta ainda se encontrava no exílio. Além de poeta, Gullar é dramaturgo, ensaísta, artista plástico e crítico de arte, com algumas incursões pela música popular e erudita, como letrista – colocou letra no famoso Trenzinho Caipira, de Heitor Villa Lobos Resumindo, Ferreira Gullar é gênio. Quando da publicação do Poema Sujo, Vinícius de Moraes assim se manifestou: “Gullar é o último grande poeta brasileiro.” Otto Maria Carpeaux, o notável crítico que a Áustria mandou para o Brasil, e Tristão de Athayde fizeram coro ao “Poeta da Paixão e foram mais longe. O primeiro: “Sua inteligência é algo extraordinário, seu talento poético de alta categoria [...] Grande poeta e grande crítico de poesia.” Mestre Athayde, pseudônimo de Alceu Amoroso Lima: “O lirismo trágico e subversivo de Ferreira Gullar é um pequeno mundo dos problemas mais candentes da beleza poética deste fim de civilização e deste século que estamos vivendo em carne viva, e de que esse grande poeta é uma das vozes mais autênticas.”
Se fosse jogador de futebol, ele poderia ser chamado polivalente. Mas Ferreira Gullar, pelo que me consta, jamais calçou um par de chuteiras na vida. Multimídia? Não gosto desta palavra, que também não combina com ele. Mas vamos lá. José de Ribamar Ferreira, em setembro, completa 80 anos. Lúcido e em plena atividade intelectual, é apontado, quase por unanimidade, o maior poeta brasileiro vivo, embora, já dizia Drummond, poeta não se mede com fita métrica.
Filho de um quitandeiro, nasceu em São Luís, Maranhão, estado mais pobre do Brasil, ao lado do vizinho Piauí, que também deu grandes poetas, como Mário Faustino e Torquato Neto – ambos precocemente mortos. Neste caso, a miséria do Maranhão é a mesma do Piauí, só separada pelo rio Parnaíba.
Mas Ferreira Gullar, pseudônimo literário que adotou, mudou-se para o Rio de Janeiro em 1951, de só onde saiu para o exílio, vinte anos mais tarde, depois de perseguido e preso pela ditadura militar.
Seu livro de estreia, Um pouco acima do chão, foi premiado pelo Jornal de Letras, do Rio de Janeiro. Manuel Bandeira fazia parte do corpo de jurados. Em 1954, publicou A Luta Corporal. Sobre este livro há um episódio curioso. A poesia de Gullar quase sempre esteve focada nas questões sociais. E foi com espanto que o poeta, numa livraria carioca, encontrou seu livro no meio de publicações esportivas. Fato semelhante ocorreu com outro poeta brasileiro, Mario Quintana, cujo livro Apontamentos de História Sobrenatural, repousava na prateleira das xaroposas obras de auto-ajuda.
No exílio, Gullar passou por diversos países, Rússia, Chile, Peru e Argentina. Em Buenos Aires, além de colaborar no jornal O Pasquim, uma das mais importantes publicações da imprensa brasileira no combate à ditadura, para sobreviver, também deu aulas particulares de português. E foi exatamente em Buenos Aires, depois de um longo silêncio, que ele escreveu, entre maio e outubro de 1975, a sua obra mais importante, Poema Sujo, publicado no Brasil quando o poeta ainda se encontrava no exílio. Além de poeta, Gullar é dramaturgo, ensaísta, artista plástico e crítico de arte, com algumas incursões pela música popular e erudita, como letrista – colocou letra no famoso Trenzinho Caipira, de Heitor Villa Lobos Resumindo, Ferreira Gullar é gênio. Quando da publicação do Poema Sujo, Vinícius de Moraes assim se manifestou: “Gullar é o último grande poeta brasileiro.” Otto Maria Carpeaux, o notável crítico que a Áustria mandou para o Brasil, e Tristão de Athayde fizeram coro ao “Poeta da Paixão e foram mais longe. O primeiro: “Sua inteligência é algo extraordinário, seu talento poético de alta categoria [...] Grande poeta e grande crítico de poesia.” Mestre Athayde, pseudônimo de Alceu Amoroso Lima: “O lirismo trágico e subversivo de Ferreira Gullar é um pequeno mundo dos problemas mais candentes da beleza poética deste fim de civilização e deste século que estamos vivendo em carne viva, e de que esse grande poeta é uma das vozes mais autênticas.”
[Foi respeitada a ortografia brasileira]
Júlio Saraiva – São Paulo, Brasil
(Recebido por e-mail)
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