quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Ernesto Tomé

As minhas para contigo
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9.ª carta
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Nesta hora de agonia, ao sol morrente,
sem versos, sem ternura, sem paixão,
eu vou-te confessar, sinceramente,
o que sente o meu pobre coração...
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Nem palavras em brasa, nem nenhuma
comoção, apesar de te perder,
e neste triste desamor sinto uma
vontade incompreendida de esquecer...
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Morreu-me a crença, aquela velha crença,
cheia de enlevo pelos teus encantos,
e o riso alegre, claro, de nascença,
que desfazia em graça os meus quebrantos...
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Andas perdida, há muito, nos rodeios
dum grande amor que em tempos nos prendeu,
velho amor feito de almas e receios,
que eu nem me lembro já como nasceu!
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Quero prender-te, amar-te como então,
enternecer-te com palavras mansas,
mas sinto regelado o coração
e uma apatia própria das crianças!
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Exiges que te explique porque não
levo uma vida cálida e febril,
como se tu soubesses a razão
porque morrem as rosas em Abril...
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Nem os teus olhos já me são queridos,
olhos cheios de mágoas sufocadas,
esses teus olhos tão entristecidos
por tantíssimas lágrimas choradas...
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Passas por mim, e eu vejo-te passar
sem ter a mais pequena comoção,
nem sinto tentações de te apertar,
como outrora, de encontro ao coração!
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Inverno... Vê lá tu, nem já com prantos
tu me convences ou me sobressaltas,
e o teu sangue fremente de quebrantos
mais intumesce as tuas veias altas...
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Inverno aberto sobre as nossas almas,
sem versos, sem ternuras, sem paixão,
damos as mãos, assim, palmas com palmas,
e nem te sinto já no coração!
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Ernesto Ferreira Gomes Tomé, nasceu em Santana, Figueira da Foz, em 31 de Maio de 1894, e faleceu em S. Tomé a 25 de Outubro de 1975.
Campeão nacional de remo, pelo Ginásio Clube Figueirense, foi desportista que se bateu em várias frentes do desporto figueirense
Foi director de várias publicações figueirenses, foi presidente da Comissão Municipal de Turismo da Figueira da Foz e director do Grande Casino Peninsular, professor da Escola Industrial e Comercial da Figueira da Foz onde leccionou português, francês, aritmética, geografia, escrituração e contabilidade.
Foi agraciado com o grau de Grande Oficial da Ordem Militar de Aviz.
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Escreveu, entre outras obras, além de "As minhas para contigo", de 1949, Romantismo (1915), Feixe de Sonhos, Livro do Desencanto, Legendas, Poeira de Palavras, Ilha de S. Miguel, 100 pingos de tinta, Prontuário do Código Civil e Legislação, Duas revoluções, Monografia do Batalhão de Metralhadoras n.º 2. A Educação física pelo escotismo, Um método de educação física, Como se deve remar, O desporto do remo, Ginástica para velhos, Não se deve fazer ginástica..., Exercícios escolares e horários escolares, Cartilha do condutor militar de automóveis e Base gerais para um método de treino no remo.
Foi uma figura de relevo no meio figueirense.

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