quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

A sesta de Nero

Fulge de luz banhado, esplendido e sumptuoso,
O palacio imperial de porphiro luzente
E marmore da Laconia. O tecto caprichoso
Mostra, em prata incrustrado, o nacar do Oriente.
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Nero no tóro eburneo estende-se indolente...
Gemmas em profusão do estragulo custoso
De ouro bordado vêm-se. O olhar deslumbra, ardente,
Da purpura da Thracia o brilho esplendoroso.
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Formosa ancilla canta. A aurilavrada lyra
Em suas mãos soluça. Os ares perfumando,
Arde a myrrha da Arabia em rescendente pyra.
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Fórmas quebram, dansando, escravas em choréa...
E Nero dorme e sonha, a fronte reclinando
Nos alvos seios nús da lubrica Poppéa.
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(Foi respeitada a ortografia da época)

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Olavo Bilac, do livro “POESIAS”, publicado em 1921 pela Livraria Francisco Alves, na Rua do Ouvidor, no Rio de Janeiro (Brasil). A oferta da obra que possuo, foi feita pela Livraria Fonseca, de Maceió (Brasil). Este foi o primeiro poema publicado por Bilac.
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Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac nasceu no Rio de Janeiro em 1865, filho de Delfina de Paula e Brás Martins dos Guimarães, médico, que na altura do nascimento do filho era cirurgião do exército brasileiro, servindo na Paraguai.
Depois dos primeiros estudos no Colégio São Francisco de Paula, Olavo Bilac iniciou em 1880 o curso de Medicina (que interrompeu) e o curso de Direito em 1887.
Em 1884 publicou o seu primeiro poema na imprensa, na “Gazeta de Notícias” (jornal carioca) facto que representava toda a glória possível para um candidato a poeta. Era o soneto “A sesta de Nero”, que foi incluído mais tarde no seu primeiro livro “Poesias”, editado em 1888.
Em 1898 foi nomeado inspector do ensino público do Rio de Janeiro.
Reconhecido como grande poeta, tornou-se secretário da Conferência Pan Americana do Rio de Janeiro, em 1906, e secretário do prefeito do Distrito Federal em 1907.
Olavo Bilac viajou à Argentina integrando a comitiva do presidente Campos Sales e foi várias vezes à Europa. Escreveu em quase todas as revistas e jornais importantes do seu tempo e, em 1907, foi eleito “Príncipe dos Poetas Brasileiros”.
Participante activo e requisitado da vida brasileira (e em particular da carioca), Bilac defendia fervorosamente a abolição da escravatura e os ideais republicanos. Jornalista de oposição ao governo de Floriano Peixoto, foi perseguido e chegou a ser preso. Mais tarde, quando solto, exilou-se voluntariamente durante algum tempo em Minas Gerais. Bilac viveu de perto grandes acontecimentos e campanhas: a fundação da Academia Brasileira de Letras (em 1896) de que foi membro fundador, as campanhas cívicas pela instrução e pelo serviço militar obrigatório (iniciadas em 1915) e a fundação da Liga de Defesa Nacional (em 1916), campanhas estas que o levaram a percorrer o Brasil em defesa e propagação dessas ideias.
Ao morrer, em 1918, o seu enterro foi acompanhado por uma enorme multidão
As homenagens póstumas que lhe prestaram, a sua constante evocação em eventos cívicos e a sua presença na produção cultural mais contemporânea sublinham a importância de Bilac para a compreensão da cultura brasileira.
Quando Bilac nasceu, estava acesa a Guerra do Paraguai e quando morreu, morria também a primeira Guerra Mundial.
Olavo Bilac foi uma das mais ricas personalidades da fascinante “bellex époque” à brasileira.
Foi poeta boémio, jornalista polémico, cronista, redactor de anúncios e autor de versos satíricos. Bateu-se em duelos, foi abolicionista, republicano e antiflorianista. Autor marcado pelo extremo rigor na linguagem e na forma, os seus sonetos são compostos em versos decassílabos perfeitos.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Fraternidade

O homem busca, insistentemente,
A paz perdida num remoto dia.
Mas é em vão; e cada vez mais sente
A sua via inútil e vazia.
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Ainda não quis ver, sempre descrente,
Que no servir e dar é que se cria
A fonte donde milagrosamente
Brota o amor, a paz e a alegria.
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Procurar ver no próximo um irmão,
Servir e amar com todo o coração,
Ver sempre o lado bom das coisas más,
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Só nesse abraço de fraternidade,
A envolver enfim a Humanidade,
Pode encontrar a desejada paz.
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Maria Teresa Biscaia (figueirense)
Nos 75 anos do Rotary Club da Figueira da Foz - 23 de Fevereiro de 1980

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Quando nascem as palavras

neste destino de compor silêncios
vou desenhando palavra por palavra
o teu regresso
.
um dia chegarás... um dia ...
talvez surjas de um soneto de camões
ou de uma canção de espanca ou de neruda
.
que importância tem isso, amor
se sei do teu corpo como se existisses
se continuo a incendiar de flores
os caminhos que nunca percorremos
.
mesmo quando o céu despe o seu metal azul
para dar lugar à noite recatada
é o teu nome que leio na ursa maior
tão geometricamente sem sentido
que as nuvens se afastam silenciosas
e macias como os teus cabelos de veludo
.
não, amor, nem sequer iludo os dias
se te imagino é para te ter mais verdadeira
tão impossivelmente real como este poema
que começa no desejo de te eternizar em estátua
.
eu só amo o que não tenho, amor
ajuda-me a lembrar-te como eras então
quando ainda não existias
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é tão triste aprender que um poema acaba
quando nascem as palavras
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Mário Jorge Meireles Moura Teixeira (mensão honrosa em poesia lírica nos XV Jogos Florais-1972-, XI Nacionais, VI Luso-Brasileiros, organizados pelo Grupo Desportivo da CUF - Barreiro - Portugal)
 
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