quarta-feira, 26 de janeiro de 2011



APELO AO VENTO

Da praia imensa a brisa te levou
De meus olhos para lá do horizonte,
E as penas que meu peito soluçou
Não vislumbro no mundo quem as conte.

E fui chorando meu choro devagar
Tal como a brisa que te afastou de mim,
E nem aquela força de te amar
Evitou que teu amor chegasse ao fim.

E esse enlevo que despertava madrugadas
E sorria sempre que chegavas
Despertando no meu leito o arrebol,

Não sei se se perdeu com o meu lamento!
Possa a brisa dar lugar ao vento
E que regresses mesmo ao pôr-do-sol.

Aníbal José de Matos (Figueira da Foz – Portugal) - Dezembro 2010

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Miguel Torga


M Ã E

Mãe:
Que desgraça na vida aconteceu,
Que ficaste insensível e gelada?
Que todo o teu perfil se endureceu
Numa linha severa e desenhada?

Como as estátuas, que são gente nossa
Cansada de palavras e ternura,
Assim tu me pareces no teu leito.
Presença cinzelada em pedra dura,
Que não tem coração dentro do peito.

Chamo aos gritos por ti — não me respondes.
Beijo-te as mãos e o rosto — sinto frio.
Ou és outra, ou me enganas, ou te escondes
Por detrás do terror deste vazio.

Mãe:
Abre os olhos ao menos, diz que sim!
Diz que me vês ainda, que me queres.
Que és a eterna mulher entre as mulheres.
Que nem a morte te afastou de mim!

Miguel Torga

Miguel Torga, pseudónimo do médico Adolfo Correia Rocha,nasceu em São Martinho de Anta, concelho de Sabrosa, em 12 de Agosto de 1907 e faleceu em Coimbra a 17 de Janeiro de 1995. Foi um dos mais importantes escritores portugueses do século XX, considerado mesmo, por alguns, o poeta português mais importante do século XX.

O poema aqui reproduzido foi cantado, entre outros, por Frei Hermano da Câmara.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

R e g r e s s o



Vê como adormece o Sol no horizonte
Na almofada do poente repetido,
Os pássaros se recolhem ansiosos
Escondendo-se entre a folhagem
Da noite que pressentem insegura.

Repara como o dia traz a luz
Que fugitiva se escondera no ocaso,
E as aves se agitam novamente
Na alegre surpresa do regresso
Do astro que ontem se ocultara.

Aníbal José de Matos
 
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