segunda-feira, 16 de agosto de 2010


Feitiço do tempo

Fazes parte do meu imaginário
Como uma jóia num relicário.
Sublime como obra de arte
A mais rara de um museu.
És tudo o que me resta,
És como o último minuto
Que falta para o fim do dia.
Vejo-te como um talismã
Que já não tem amanhã
Porque o amanhã não existe.
És como o eterno feitiço
Do tempo que está a acabar.

Subo ao mais alto monte
Para ver a planície.
Resume-se o horizonte
Ao vento que sopra e passa
Como um rosto que sorrisse
Sem fazer um movimento.
Um movimento leve, leve,
Tão infinitamente leve
Como a alva e pura neve
Que há muito deixou de cair...

É o fim de um longo dia
Que ainda ontem começou
Com um calor tão intenso
Que hoje até me convenço
Que meu corpo alimentou
Com o mais vivo lume
Que queima como o ciúme.

Mas na vida tudo parte
Sem magia, sem mais arte...
Tudo passa
Tão sem graça
Que me dói o coração.
Dói-me sem mais razão
Porque o segredo
Que guardo com tanto apego
É como o feitiço do tempo!

Olho este mundo corrupto
Sem dar qualquer atributo
Que não saibas possuir.
Sinto em mim um sério medo
Porque ainda é muito cedo
Para te dizer: “Vou partir.”

Minha alma não contesta
O fraco amor que lhe resta...
No monte mais alto do mundo
Continuo a ver a imagem
Que me arrastou num segundo
Para a mais louca viagem.

Hoje nada mais me resta
Senão a lembrança da festa
E nada mais do que isso!...

Guardo no pensamento
Esse amor como feitiço,
Como um feitiço do tempo.

Filipa Duarte (Poetisa de Tondela)

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