Ifan tão an!
(Poema de memórias)
Esmagado pelo ruído
do silêncio,
Por imensos decibéis de solidão,
Atravesso um deserto de contrastes
Em que a vida se desbobina como um filme
Em rodagem permanente e insensível,
E constantes sons de claquete,
À espera do “corta” diretivo.
E a infância surge no ecrã
Envolta no sorriso da inocência.
Mi
Choá, mi Choá,
Um
cijá pró pai fumá.
E o percurso surge sem agruras,
Com beijos e abraços à mistura
De gentes que enchem doce lar
Em que o amor é uma constante
Trazida por mil braços de carinho.
Como
ele está crescido; faz-nos velhos!
Corre, corre, vem depressa, olha o
comboio.
Pouca-terra, pouca terra.
E o silvo sibilino
Soa no imenso vale num esfusiante grito.
Mas como aos meus ouvidos é sublime o
seu trinado,
Melodia na alma da criança.
E aceno p’ra mil rostos com destino,
Num mundo a percorrer veloz
Carris e sulipas de esperança
Envolto em cores de arco-íris,
Sobre um Dinha calmo e ternurento.
Pouca-terra, pouca-terra!!!
E à nossa porta uma carroça ronceira
Desfila no caminho sobre pedras
Que se soltam à passagem de rodas ferrugentas.
A voz do Adelino clama entre pinhais,
E eu embarco encantado rua abaixo
Passando pelo Torno da saudade.
Eixe
cabano.
Lá vai ele numa labuta constante e
dolorosa.
Mas comigo vai o sorriso que abarca
Um incontável mundo de horizontes.
A paz regressa ao vale.
E ao longe ouço hinos de louvor
Oriundos de uma casa de oração.
“Mestre,
o mar se revolta,
As
ondas nos dão pavor.
Sossegai,
sossegai”
Vidas com percalços e angústias,
Saudades, perdas e encontros,
Veredas transpostas com agruras
Mas muitos salpicos de doçura.
E há sempre na vida uma Maria,
Que nasce das teclas dum órgão
Que envolve minha alma.
A cidade tem momentos de cor fantasiosa,
E uma Avó que estraga com mimos e
encantos.
Vó,
qui ifan tão an!
Vó
tem mê?
Meni
não tem mê não.
E o gigante passeia na calçada
Entre aplausos e faces risonhas de
surpresa.
Qui
ifan tão an!!!
É um desfilar na mente,
É um perpassar constante de figuras
Ternas e saudosas.
É a um tempo um misto de lágrimas e
sorrisos
Um relembrar de um tempo em que os
amplexos
Queimavam por amor.
Qui ifan tão an!!!
…………
Voaram esses tempos e os ventos.
E entre o ensurdecedor ruído do
silêncio,
A solidão abre a porta de mansinho
E vem afagar-me o rosto,
Beijar as minhas mãos,
E dizer-me num sussurro:
Não tenhas medo.
Tu não estás só
Porque vou ficar contigo.
………
Eu sei que tenho Deus a controlar a
minha solidão
Neste ensurdecedor ruído do silêncio.
Aníbal José de Matos
(Poema escrito e lido pelo autor numa tarde cultural, na Igreja Evangélica Figueirense, em 6 de dezembro de 2014)
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